Silvio Ramalheira

O Capitão Sílvio Ramalheira nasceu em Ílhavo em 2 de Dezembro de 1902. Filho de João Pereira Ramalheira, de alcunha, o Pisco, também ele capitão da Marinha Mercante, nascido em 1868, e de Maria Rosa de Jesus. Casou, civilmente, com Maia Júlia Magano, em 6 de Janeiro de 1927, casamento de que não houve descendência. De segundas núpcias, teve três filhos, dos quais o mais velho, de nome Sílvio Ramalheira, seguiu a carreira da Marinha de Guerra, segundo desejo do Pai. A sua primeira viagem aos bancos, fizera-a, como “moço”, com cerca de dez anos, no lugre-patacho “Gazela I”. Mais tarde e, consultados os primeiros jornais de Ílhavo, fora piloto, nos anos de 1922, 23, 25 e 26 do dito “Gazela Primeiro”, sob o comando do Pai, João Pereira Ramalheira, o Pisco. Mais tarde, na campanha de 1932, comandara-o. O bichinho do “Gazela” ficara-lhe, mas, vida é vida e saltitou, então, no comando entre mais três lugres da Parceria – o velho “Argus”, mais tarde o “Ana Maria”, em 1927 e 29, o “Neptuno II”, em 1928 e 30 e o velhinho “Gamo”, na campanha de 1931. Entre 1932 e 34, a sua vida dera uma grande reviravolta. Deixou a Parceria, para comandar o lugre “Maria da Glória”, da praça de Aveiro. Era um belo lugre de madeira, elegante e capaz, onde o capitão investira as suas poupanças. Entre 1933 e 1942, o «nosso» capitão comandara este lugre, até ao seu final trágico, doloroso e pungente. Em tempos de guerra, foi afundado em 5 de Junho de 1942 por um submarino alemão, em viagem para a Groenlândia, tendo constituído uma das maiores tragédias que assolaram a nossa vila maruja. Dos 44 tripulantes, apenas se salvaram 8, em condições sobre-humanas, em dois botes despojados de tudo. E Sílvio Ramalheira foi um dos que se salvou, em muito mau estado psicológico e físico, pelos muitos estilhaços, com que tinha sido atingido na perna direita. Vários relatos doridos e arrebatadores existem deste afundamento, não sendo todos eles unânimes na sua narrativa. Muito luto, muita dor, muitas perdas, poucas notícias, muita ansiedade, muito tempo de espera. Mas a convalescença do capitão, devagar, devagarinho, de dia em dia, ia avançando, tendo sido muito longa, dolorosa e morosa. Nos anos de 1943, 44 e 45, ficou em terra, não vendo mais jeito de recuperar a perna ferida, sem o auxílio de muletas. Mas, dificilmente, esse tempo chegou e o seu estado físico e psicológico de tal acidente foi-se recompondo. Deve-lhe ter ensombrado a vida toda, se bem que o tempo se tivesse ido encarregando de suavizar as tragédias sofridas. Numa tentativa de minorar as suas penas e de se voltar a sentir válido, retornou ao mar, na campanha de 1946, como capitão do n/m “Lutador”., até 1948. Entre as campanhas de 1949 e de 1952, o capitão Sílvio comandou o navio- motor “Elisabeth”. Em última «emposta», saltou com regozijo, na safra de 1953, para o novo n/m, de aço, “Capitão João Vilarinho”, que comandou até 1957. Aposentou-se em Setembro de 1962, com direito a saborear um merecido descanso, depois de uma ousada e extenuante vida de mar. Deixou-nos em 26 de Abril de 1982, com 79 anos de idade.
(Texto de Dr.ª Ana Maria Lopes)